terça-feira, 28 de janeiro de 2020

STRANGER THINGS = STRANGER FANS



Quando Stranger Things estreou em 2016, logo virou uma febre mundial. Várias foram as criticas, em sua maior parte positivas, mas é logico que as criticas negativas que acusavam a serie de plagio dos livros de Stephen King ou que as referencias anos 1980 eram mais cópias de livros, séries, quadrinhos ...do que apenas singelas homenagens a época.


Para aqueles que nasceram nos final dos anos 1970 e começo dos 1980, começou a acompanhar a série com aquela pontada de nostalgia e também desconfiança. Até que ponto a série traria algo a mais do que apenas uma cópia carbono de mimeografo ?



Um bom roteiro, com as referencias certas e uma ótima escolha do elenco começa a conquistar até o mais desconfiado dos possíveis críticos no terceiro episódio. Tanto que até a então esquecida Winona Rider voltou a ver sua carreira sair do limbo, e mais do que justo, depois de tanto tempo sem um trabalho de destaque no cinema.


Agora, quem nasceu depois de 1990, o cenário apresentado é totalmente novo. As roupas, corte de cabelo, música , gírias ... Para o elenco jovem, conhecer um walkman ou uma fita VHS também foi novidade. A conexão com os novos fãs foi imediata, porque a essência da série é a amizade e esse sentimento é universal.

O escritor e pesquisador Joseph Vogel poderia fazer apenas um almanaque explicando os anos 1980, mas ele vai um pouco além. Ele explica não só a época e seus costumes, como também a parte política, social e cultural.




A  edição brasileira veio com um bônus em sua versão, além de fazer um belíssimo trabalho editorial e visual completa o livro com mais capítulos escritos por especialistas em cultura pop que dão um bônus especial a leitura . São quase 100 páginas a mais sobre curiosidades, lendas urbanas, literatura, música, jogos .... Leitura obrigatória para fãs oitentistas que querem relembrar ou descobrir coisas novas/velhas.

***Se você tem curiosidade em saber como ficou  o livro lançado pela editora DarkSide, confira o vídeo que fiz lá no You Tube !!!

LINK >>> https://www.youtube.com/watch?v=SFKgDpQ3ydQ&t=45s


STRANGER FANS
AUTOR: JOSEPH VOGEL
EDITORA : DARK SIDE
ISBN : 9788594540843












quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

GUIA DE LEITURA >> Elric de Melniboné




Considero Elric um dos personagens mais injustiçados no mundo da literatura fantástica.

Se tivéssemos que fazer uma árvore genealógica provavelmente Elric seria o avó de Geralt de Rívia por ser um grande feiticeiro, lidar com poções mágicas e conhecer todos os monstros e suas fraquezas ou mesmo o bisavó de Daenerys Targaryen, não só por seus longos cabelos brancos mas também por possuir um exércitos de dragões e ser um pouco louco e atormentado.

Mas por que  as historias de Elric inspiraram vários autores a criarem mundos tão incríveis quanto Melniboné,  habitado por bruxos, feiticeiras, guerreiros, monstros, seres medievais, intrigas, conspirações, traições e até incesto (!) e nunca foi adaptado para um filme, um game ou até mesmo uma série ?

Elric ama sua prima, a feiticeira Cymoril e aparentemente o irmão dela, Yyrkoon , também !  

Existem vários motivos : seja a complexidade psicológica de Elric e sua fragilidade física que faz com que ele dependa de poções mágicas e drogas para poder viver, sua espada Stormbringer que tem vida própria e ao mesmo tempo que dá força para ele lutar, domina a mente de Elric quase ao ponto de enlouquece-lo. Existe também  o excesso de violência dos melnibonianos, que escravizam humanos, matando-os tanto para rituais ou por puro tédio. Uma construção visual do reino de Melniboné à altura do que foi imaginado pelo autor e as várias adaptações para os quadrinhos ou mesmo um ator com características físicas parecidas e capaz de sustentar a estranheza do personagem.

Elric entre a euforia da matança com sua espada Stormbringer e seus dilemas morais

Em 1961 , Michael Moorcock começa a escrever para a revista inglesa “Science Fantasy” contos sobre um imperador de Melniboné, um rei rejeitado por seu próprio povo e um dos últimos herdeiros de sua linhagem. Elric comanda um reino que já esteve em seu ápice de grandes vitorias há mais de 10 mil anos mas agora encontra-se em decadência. Os melnibonianos, antes temidos por outros reinos, agora são menosprezados e considerados uma raça que em pouco tempo será extinta.

Detalhe da graphic novel "O Trono de Rubi"

A seu favor, Elric possui inteligência e grande conhecimento das artes magicas e feitiçarias além da sua espada Stormbringer, a ceifadora de almas. 

Esses contos viraram livros quase uma década depois e em menos tempo bem sucedidas adaptações para quadrinhos.

Histórias sobre guerreiros, seres míticos, élficos, magia, batalhas são contadas há séculos. A história de Michael Moorcock é uma mistura lendas nórdicas, medievais, poemas épicos finlandeses, gregos, anglo saxões... Segundo o próprio escritor, as histórias de J.R.R Tolkien e Conan também serviram de base para contar a saga de Elric de Melniboné.

Elric sozinho em seu Trono de Rubi - Art by Gary Jamroz

Nos anos de 1960 , Moorcock era o editor de um fanzine chamado “Amra” , ele propôs a escolha de um novo termo para diferenciar as produções de ficção que eram chamadas genericamente de “fantasia épica” ou “capa e espada” e o escritor Fritz Lieber sugeriu “espada e feitiçaria” , onde as histórias possuíam mais elementos sobrenaturais, magia, mulheres sensuais e violência. Se hoje usamos o termo “espada e feitiçaria” para classificar os livros/contos de fantasia é por causa de Michael Moorcock que popularizou o gênero.

Uma visão mais sombria de Elric em seu trono - Art by Piotr Jabłoński


POR ONDE COMEÇAR A LEITURA ?
Existem 2 livros  lançados no Brasil
Elric de Melniboné – A traição do Imperador
Elric de Melniboné _ Livro Dois

VALE A PENA LER OS LIVROS?
SIM e NÃO
SIM >>  Porque é a história original do personagem e os livros estão em ordem cronológica. A narrativa de Moorcock é bem rápida e direta. Você tem a perspectiva da história pelos olhos de Elric, suas angustias e duvidas sobre o tipo de governador que ele quer ser com aquilo que esperam dele. Michael Moorcock não fica enrolando o leitor, seus diálogos são muito bons e  dá para entender porque ele já foi adaptado tantas vezes para os quadrinhos. A leitura é super fluida, dá para ler em 2 ou 3 dias no máximo !

NÃO >>  As edições brasileiras são apenas duas e sem previsão de lançamento para as outras. São 6 os livros da saga de Elric e para os leitores compulsivos 500 paginas (ao total) não é nada ! Os livros possuem uma boa tradução, tem capa dura com bom acabamento mas pecam por não trazerem um histórico sobre o escritor e seu personagem e a importância da saga. 

Elric serviu de inspiração para muitos autores. Qualquer semelhança ...

VALE A PENA LER OS QUADRINHOS ?

Sim, especialmente a edição lançada pela editora francesa Glénat . São 4 edições que seguem a ordem cronológica do personagem e possuem uma das mais belas artes feitas para uma graphic novel. A edição brasileira saiu pela Mythos editora, que compilou o 1 e 2 tomo em uma só livro. A editora Glénat ainda não divulgou o lançamento da 4ª edição até o momento, sendo que a terceira foi lançada em 2017 e a Mythos depende desse quarto quadrinho para poder lançar a continuação por terras brasileiras.

A nova versão em quadrinhos pela editora Glénat 


VALE A PENA COMPAR OS QUADRINHOS IMPORTADOS ?
Depende do seu bolso... mas vale cada centavo !
"The Michael Moorcock Library", são 5 edições com as ilustrações clássicas lançadas nos anos 1980 ilustrados por P.Craig Russell (trabalhou em várias obras de Neil Gaiman : Sandman, Livros da Magia, Deuses Americanos) adaptado por Michael T.Gilbert  (trabalhou para a DC , Dark Horse e na revista Heavy Metal) e Roy Thomas (sucessor de Stan Lee na Marvel, também foi o responsável pelos primeiros quadrinhos do Conan) 

A clássica adaptação dos anos 1980

SEU INGLÊS ESTÁ EM DIA ?
Quando Michael Moorcock começou a saga de Elric ele não pensou em uma história com começo, meio e fim. Não fez nenhum organograma ou planejamento individual com cada personagem, como aconteceu com George R.R. Martin e seu "Guerra dos Tronos".

As histórias foram acontecendo e por isso mesmo ela inicialmente não possui uma ordem cronológica. Bem parecido com a saga de "The Witcher", que começa com as memórias de Geralt no primeiro livro "O ultimo Desejo"

Se você é fluente ou quer melhorar seu inglês os livros são uma boa opção e as versões americanas, pocket books, são as mais baratas, mas você consegue encontrar as versões em e-book grátis em fan sites , que são mais confiáveis.



(IElric of Melniboné
(IIThe Sailor on the Seas of Fate 
(IIIThe Weird of the White Wolf
(IVThe Vanishing Tower
(VThe Bane of the Black Sword
(VIStormbringe



Elric de Melniboné: Livro Um: A traição do Imperador (2014)
Editora: Generale
ISBN: 9788563993960

Elric de Melniboné: Livro Dois (2017)
Editora: Generale
ISBN: 9788584611157

Boa Leitura !!!

ASSISTA AO VIDEO NO YOUTUBE TAMBÉM >> https://youtu.be/rEnngTP_jYQ

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

"A Pequena Caixa de Gwendy" mais uma história de Castle Rock, a cidade mais azarada do Maine




Difícil começar essa resenha de “A pequena caixa de Gwendy”...
Vamos começar pelo básico então;  o livro tem 162 paginas, edição capa dura com a belíssima arte de Ben Baldwin e as ilustrações de Keith Minnion. Foi escrito com a colaboração do escritor/roteirista Richard Chizmar e nenhuma de suas obras foram publicadas no Brasil até o momento.

A história se passa em Castle Rock durante o verão de 1974. A família da pré adolescente Gwendy mudou-se a pouco tempo e ainda está em processo de adaptação. Ela está com 12 anos, sente-se um pouco perdida, sem amigos e com medo de não ser aceita no colégio, seja por seu peso ou aparência. Por isso resolve fazer exercícios e sua meta é correr alguns quilômetros até a “escada suicida”, subir e chegar no Parque Recreativo de Castle View. Mas, um dia, durante essas caminhadas, Gwendy encontra um cara bem peculiar no meio caminho. Quando esse homem tenta puxar conversa com ela, Gwendy diz que não pode conversar com estranhos, então ele se apresenta ; Sr. Farris, “agora não sou mais um estranho”, ele diz. A garota sabe que a conversa deveria parar por aí, mas ela sente-se atraída a continuar, quase que magicamente.

 Ilustrações de Keith Minnion


Então o Sr. Farris diz que pretende dar um presente que ira mudar a vida da Gwendy e que ela será sua guardiã até o dia que ele voltar. Ele mostra uma caixa, com vários botões e alavancas, mostra quais apertar e quais as conseqüências se não usar a caixa do modo correto.

O resumo da história para por aqui !!! 
Agora vamos aos fatos >>>

“A pequena caixa...” não é um livro ruim, mas longe de ser o livro que irá mudar algo na sua vida.

Dá para ler em um final de semana, mesmo a história sendo simples ela prende a atenção.

Vale a leitura ? Sim 

Este é um livro juvenil, se não foi pensado assim originalmente não sei responder. Sua linguagem é bem dinâmica, muitos diálogos, sem palavrões, sem mortes escatológicas ou bizarrices, características de muitas obras do mestre.

De vez em quando, Stephen King gosta de homenagear seus autores favoritos trazendo alguns elementos para suas histórias; nesse caso temos um conto escrito por Richard Matheson, “A Caixa” que tem exatamente a mesma premissa. 

Caso você tenha curiosidade aqui vai o link  >> http://www.saidadeemergencia.com/files/products/Caixa.pdf

Me pergunto se a “ajuda” de Richard Chizmar seria para aumentar um conto para virar uma novela ou enxugar uma história maior, pois sabemos o quanto SK é verborrágico na sua escrita !   

E fica aquela sensação... de que seu lançamento, na mesma época da estréia do seriado “Castle Rock” é muita coincidência ? Não !

O livro acrescenta mais uma história fantástica as muitas que acontecem na cidade de Castle Rock e serve de introdução para um publico mais jovem que nunca leu nada do King e também para os fãs de carteirinha, que sempre precisam ler/ter mais um livro do seu escritor favorito.

Não acredito que a história de Gwendy entrará para a mitologia mostrada na série, mas quem sabe eles não escrevam sobre a Escadaria Suicida ? Dá para fazer um episodio só contando as coisa estranhas que acontecem nessa escada do mal !

Ainda não assistiu a série ??? Leia a critica aqui no blog e faça uma tour por “Castle Rock”


A PEQUENA CAIXA DE GWENDY
AUTORES : STEPHEN KING & RICHARD CHIZMAR
EDITORA : Suma de Letras
ISBN : 9788556510754

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Coisas estranhas acontecem em Castle Rock - a série



Caso você queira fazer uma visita para uma das cidades mais macabras do Nova Inglaterra, tenho uma péssima noticia; a real Castle Rock fica no Colorado! Nem adianta procura nos sites de viajem, Stephen King colocou uma Castle Rock no Maine inspirado em dos seus romances preferidos: “O senhor das moscas” escrito por William Golding.


A cidade fictícia de Castle Rock já foi palco de várias histórias de terror do mestre. Aliás, ela também está bem perto de Derry, outra cidade que está fora do mapa oficial dos Estados Unidos! A intenção do King ao misturar nomes de cidades ou vilarejos que realmente existem com outros inventados é para confundir mesmo, a geografia está totalmente invertida, um mapa alternativo do mal.

Esse recurso literário fica claro em mais da metade das suas obras, que tem como cenário sua terra natal e onde SK residente até hoje. Por isso tudo parece mais crível ao ler um livro do King, que consegue situar o leitor no cenário ao descrever os lugares, o clima, as pessoas, as ruas, casas, comércios... Mas fique atento, porque a qualquer esquina ele pode te conduzir a um assustador mundo paralelo.

Não deve ter sido tarefa fácil, nem mesmo com a colaboração de SK, colocar tantas referencias, personagens, organizar uma linha do tempo usando vários livros e ser coerente com a nova história apresentada na série.

O diretor/produtor J.J Abrams fez um ótimo trabalho com a série Castle Rock, são 10 episódios que não perdem o fôlego, do começo ao fim. Aliás, o primeiro episodio foi um dos mais assustadores em series que já vi até hoje ! 

Em um passado recente, J.J Abrams mandou bem ao adaptar o “11/22/63” também do King, ficou praticamente igual ao livro, com as devidas mudanças para a serie, mas sem comprometer a história original.

A série é uma história original, baseada em vários livros do King.
Pergunta : “Preciso ler todos esses livros para entender o que está acontecendo ?”
Resposta : Não !!!

O ponto positivo de “Castle Rock” é atrair o fã de terror/suspense, seja ele super fã do King, ou aquele que já leu alguns livros ou aquele que nunca leu nada e só viu as adaptações para o cinema.

Resumo rápido da história: Um advogado é chamado de volta a sua cidade natal para ajudar um jovem encontrado em uma jaula na parte desativada da prisão de Shawshank.
Os dois tem um passado em comum, mas só um deles tem esse conhecimento e tentará  mudar suas histórias que se cruzaram há 27 anos.

Pronto, é isso ! Contar mais é spoiler !!! Olha o recado do próprio King sobre easter -eggs


OBS >> Abaixo seguem algumas dicas de leitura, curiosidades e spoilers !

Logo na abertura você irá encontrar várias referencias aos livros e contos do King. 




As cidades do mapa e suas histórias :
Castle Rock : “A espera de um milagre” ,“Cujo”, “Zona Morta”, “Trocas Macabras”, “Conta Comigo”, “Depois da Meia Noite”, “Um sonho de liberdade”
Haven : Os Estranhos , série tv Haven (2010 –2015)
Desert Island :  “Eclipse total”, “Tempestade do século”  “Jogo perigoso”
Bridgton : “A nevoa”


Referencias ao livro “ O Iluminado”
1. A loucura do pastor Matthew Deaver e Jack Torrance , ambos enlouquecem e querem matar suas famílias.
2. Molly Strand  tem as mesmas habilidades psíquicas de Danny Torrance
3. Diane “Jackie” Torrance é sobrinha de Jack Torrance, adora histórias mórbidas e sabe tudo sobre machados.


Pelo visto, a sobrinha de Jack Torrance é fã da radio rock do Rei  ;)

Detalhes tão pequenos ...

Thomas Newman é o mesmo compositor das trilhas de “A espera de um milagre” e “Um sonho de liberdade”

Em "A espera de um milagre" o personagem John Coffey cura as pessoas com seu toque , já o personagem "O garoto" tem efeito contrário. 



Esse cara trabalha ! O Xerife Allan Pangborn já apareceu em vários livros como personagem em destaque ou coadjuvante : “Trocas macabras”, “A metade negra”, “Depois da meia noite”, “Jogo Perigoso” e “Saco de Ossos”

Durante 27 anos "O garoto" fica preso na jaula  e a cada 27 anos, o palhaço de It aparece em Derry !

7 atores que estão em Castle Rock já atuaram em outros filmes ou séries baseadas nas obras de SK.


Referencias à Torre Negra aparecem na forma de corvos, explicações sobre mundos paralelos , zumbidos na floresta, o rei vermelho e o famoso numero 19. Fiquem atentos !!!

Vários easter-eggs  na abertura da série  :







Fontes de informação para a resenha >>

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Sonhos Eletricos _ Electric Dreams / O livro e a série


Sonhos Elétricos – O Livro

As histórias de PKD são bem peculiares, até mais do que os de outros romancistas de ficção científica.Não se trata apenas de carros voadores, lasers ou robôs, o fator humano em sua obra é o principal; os conflitos, os sonhos, as decepções, a ( i ) mortalidade e a loucura.

Quando alguém que nunca leu PKD me pergunta por qual livro deve começar eu sempre indico “UBIK” e “Realidades Adaptadas”, agora posso acrescentar “Sonhos Elétricos” para a lista.
>>> Em breve: Guia de Leitura PKD aguardem !!!

Em sua vida, Philip K Dick escreveu mais de 120 contos e 36 romances. Ele escrevia compulsivamente, em parte para poder pagar suas contas e também para colocar todos aqueles mundos para fora da sua mente. Uma mente habitada tanto por fantasmas do passado quanto do futuro.

Ao ler “Sonhos Elétricos” você irá encontrar algumas de suas inquietações, sobre a guerra nuclear, o consumismo, a invasão de privacidade, aceitar a realidade que nos cerca ou procurar por uma outra. Aquela velha duvida: tomar a pílula azul ou a vermelha?

Até hoje não consegui encontrar nenhum escritor com a mesma loucura/genialidade de PKD. Diferente de Asimov, que era um cientista e trazia para a sua obra previsões mais tecnológicas, ou mesmo Arthur C Clarke que tinha uma pegada mais espiritual; talvez você encontre uma similaridade com a obra de Ursula K LeGuin que usava como fundo a ficção cientifica para escrever sobre assuntos mais profundos sobre a humanidade e seu futuro.

Não vou fazer a resenha de conto por conto.Você pode encontrar isso em outros sites que possivelmente irão atrapalhar mais que ajudar. No artigo em que faço um comparativo entre os contos e as adaptações apenas resumo as histórias, nada que interfira na sua futura leitura. Uma dica: leia com a mente limpa e aberta, assim você consegue viajar durante todo o livro. Basta dizer que todos os contos são ótimos, e com certeza você vai escolher os seus preferidos ao final do livro. Os meus destaques vão para: “Humano É”, “O Passageiro habitual”, “Argumento de venda”, “O planeta Impossível” e “Foster, você já morreu”. A única exceção foi “Autofab”, o conto que menos me cativou e que até ficou bem adaptado para a série. Mas isso você vai ler daqui a pouco!  


Pergunta : É preciso ler o livro antes de ver a série ?
Resposta : Não. São experiências bem diferentes.Mas sabe aquela velha frase: O livro é melhor...vale para este caso.
Pergunta : É tão ruim assim?
Resposta : Ficou razoável , acredito que os 10 diferentes diretores quiseram deixar sua “assinatura” e muitos perderam a mão e não respeitaram o texto original ou não foram coerentes com a obra de PDK
Pergunta : Vai ter spoilers nos comentários?
Resposta : Quem sabe...



Electric Dreams  - A série

A difícil arte de adaptar

Não deve ser fácil ser roteirista.
O roteirista precisa se “apropriar” da obra do escritor para adapta-la ao cinema, série ou um episodio com menos de uma hora, sem tirar seus elementos principais e personagens. É preciso ser fiel a história e ao mesmo tempo acrescentar ou retirar algumas partes. Um cirurgião plástico usa procedimentos bem parecidos, mas como já sabemos, existem as boas plásticas e aqueles que são um desastre total.

No livro “Sonhos Elétricos”, antes de cada conto, você encontra as explicações de cada roteirista de como o processo foi feito; o que foi mantido do texto original, as mudanças e adaptações. Recomendo ler após ver cada episódio, mas fique a vontade caso queira ler antes!


Aqui está a lista dos melhores aos piores >>
*** Boa adaptação
**   Ok , dá para encarar
*     Só se você estiver com tempo sobrando


*** Kill All Others (O enforcado desconhecido)
Homem sai na rua e vê corpo pendurado em um poste. As pessoas passam por perto e nem ligam. Incomodado com a situação ele começa a questionar os amigos, vizinhos e a sua mulher.Todos dizem para ele deixar isso para lá e não se importar. A adaptação foi bem inteligente em colocar o dedo na ferida em temas atuais como a política, o ódio gratuito pelo diferente, pelo estrangeiro e o medo da vigilância digital. Ficou com uma cara de episódio do Black Mirror, e ficou muito bom.  

É sério que vocês não estão vendo esse outdoor ?


*** Human Is (Humano é)
Marido violento e opressor, sai em missão a outro planeta e quando volta está totalmente diferente.Existe a possibilidade de um alienígena ter invadido seu corpo para poder sobreviver na colônia humana. Cabe a sua mulher denunciar ou não seu “novo” marido, que agora está atencioso e romântico, algo que ela nunca teve antes. A adaptação não mudou muito, existe o acréscimo de alguns elementos na história mas elas fazem sentido dentro do episodio. E temos nosso eterno Walter White, o ator Bryan Cranston no papel principal e com direito a cena sensual !


Loving the Alien


*** Impossible Planet (Planeta Impossível)
Senhora idosa, surda e com a saúde bem debilitada tem um ultimo desejo: conhecer o planeta Terra. Ela contrata dois pilotos não muito honestos para fazer essa viagem, mas os próprios pilotos não sabem as coordenadas para a Terra e procuram por algum planeta similar, para assim enganar a senhora e ficar com seu dinheiro. A estrutura principal do conto ficou e também seu final. Alias, é um dos mais curtos do livro, e a adaptação virou uma história de amor. Não, não ficou ruim, foi uma solução bem pensada e talvez esse seja seu maior ponto positivo.

Em algum lugar do passado...


*** Safe and Sound (Foster, você ja morreu)
Em um futuro onde a Guerra Fria não acabou e a possibilidade de uma ataque nuclear pode acontecer a qualquer momento, todas as famílias possuem abrigos nucleares, menos a família de Foster. Seu pai é totalmente contra comprar um abrigo porque ele acredita que a Guerra Fria não existe mais e os abrigos são muito caros e desnecessários. Enquanto isso, Foster sofre bullyng na escola e vive um medo constante de morrer porque não tem onde se abrigar durante um ataque.
Os roteiristas trazem a mesma história para o tempo atual e as mudanças são enormes: Foster agora é uma adolescente, no lugar da bomba temos os terroristas; o pai vendedor de móveis virou uma mãe ativista política e o abrigo nuclear é um superhiperplus incrível celular que todos precisam ter por “segurança” pessoal e da comunidade. Outro episódio que ficou com cara de Black Mirror mas respeita a essência da obra de PKD

Nem Steve Jobs deve ter imaginado um celular igual a esse !


** The Commuter (Passageiro habitual)
Bilheteiro de uma estação de trem vê um homem desaparecer na sua frente depois de dizer que a cidade que ele quer comprar a passagem não existe. Após alguns dias o mesmo homem reaparece pedindo a mesma passagem, o bilheteiro começa a questionar onde é esse lugar e quando diz ao homem que tal cidade não existe, o homem desaparece novamente. Não vou contar mais se não vira spoiler... Um conto que precisava apenas de uma modificação: ao invés de investigar sobre a cidade em uma biblioteca a pesquisa seria feita pela internet. Pronto, só isso ! Todos os elementos de fantasia, diálogos e personagens estão perfeitos. A adaptação virou um melodrama espírita/tecnológico sem sentido.O que salva é a atuação de Timothy Spall, se não fosse por ele o episódio seria até mais fraco.

Ói, ói o trem, vem trazendo de longe as cinzas do velho éon


** Autofac (Autofab)
Uma fábrica autônoma, que funciona apenas por robôs controlados por uma inteligência artificial, produz mais produtos do que as pessoas conseguem consumir e está esgotando os recursos naturais do planeta.Um grupo de pessoas vai tentar enganar essa IA para poder destruir a fábrica.O conto original é um pouco confuso e talvez o menos cativante em termos de história e personagens. Aparentemente o roteirista Travis Beacham achou o mesmo quando diz que :“Autofab” não era o conto que pretendia adaptar de inicio” mas conseguiu fazer um bom trabalho.

We're charging our battery And now we're full of energy


** The Hood Maker (O fabricante de gorros)
No futuro a policia usa os telepatas, ou teeps, para ler as mentes de possíveis inimigas do governo que querem causar caos ou rebeliões.Os “gorros” são bloqueadores contra os teeps, e estão sendo enviados para pessoas aleatórias por toda cidade.Um movimento contra a invasão de pensamentos se espalha pela cidade ao mesmo tempo que os teeps querem tomar o controle da coisas e eliminar as pessoas normais. Aqui temos um conto clássico de PKD que revisita o assunto de telepatia, os exemplos mais conhecidos são os precogs de “Minority Report” e em sua versão anterior, em UBIK.
Novamente, e até hoje não entendo porque gostam tanto de incorporar histórias de amor nos contos ! Aqui temos um romance entre uma teep, Honor e o investigador de policia, Ross. Existe a mudança de perspectiva pelo ponto de vista da telepata, ficou bom mas não ficou incrível.    

The Hood Maker : vários "easter eggs" da obra de PKD espalhados pela episodio


E aqui vai o premio para pior adaptação >> difícil escolher qual é o mais sem noção.
O site IMDb deu até umas notas ok... mas...sem chance! Por isso fica a dica, leia os contos, você vai gostar muito mais 

* Real Life (Peça de Exposição)
Só pela introdução feita pelo roteirista você sabe que deu merda: “Resta muito pouco do conto no episódio...” Na verdade não restou nada, ficou uma mistura de “Vingador do Futuro”com alguma serie policial de investigação bem fraquinha.Chega até a dar sono de tão arrastada e confusa.Os experientes atores Anna Paquin e Terrence Howard  não seguram o episodio e parecem que caíram de pára-quedas na história.

* Crazy Diamond (Argumento de Venda)
Outra grande decepção, porque o conto é tão bom e com momentos em que você pode até rir de nervoso com algumas situações. Quem adaptou foi Tony Grisoni (Medo e delírio em Las Vegas, Mindhunters) e tem até o esquisito que amamos, Steve Buscemi. Era quase certo que seria um bom episódio... só que não.Foi até difícil reconhecer qual conto tinha sido adaptado, uma mistura de elementos da obra de PKD com filme noir, alguma coisa kitsch dos anos 70, pesquisa genética e um final totalmente incoerente. Tem que ter muita paciência até chegar o final.

* The Father Thing (A coisa-Pai)
Ok, o conto não é um dos melhores ou mais originais de PKD , mas dava para fazer uma adaptação no mínimo decente. Acrescentaram um mini drama desnecessário entre pai e filho, umas crianças totalmente deslocadas dentro da trama e uma narrativa muito lenta e introspectiva sem propósito.Parece aqueles filmes bem chatinhos com crianças que passam na Seção da Tarde, a diferença é que temos alienígenas invasores de corpos.Dos três piores é o menos pior, mas continua sendo chato.  

Steve Buscemi morrendo na praia

Para quem leu até o final dessa enorme resenha, meu muito obrigada !!! Volte sempre ;)

SONHOS ELETRICOS
AUTOR : PHILIP K DICK
EDITORA : ALEPH
ISBN : 9788576573975



quinta-feira, 7 de junho de 2018

GUIA DE LEITURA >> Triplo Terror : escolha o seu


No mundo literário, o gênero terror/suspense/policial é um dos mais difíceis de agradar quem já acostumado com esse universo. Uma coisa é certa, nem sempre a historia será inédita: casa assombrada, demônios, maldição de família, vingança, rede de intrigas, envenenamento...O que vai prender o leitor até o final do livro são: personagens empáticos, clímax, pontos de virada, deixar sempre uma duvida durante a trama e principalmente não subestima-lo com explicações simplistas e ter um final descente.

Essa seleção de livros possuem todos esses ingredientes e mais algumas boas surpresas para o leitor mais exigente >>

O Vilarejo – Raphael Montes

Um livro que é facilmente devorado em 2 horas no máximo.
São 7 contos bizarros, todos tem um ponto em comum : um vilarejo no leste europeu que desapareceu do mapa misteriosamente.

Raphael Montes é muito habilidoso ao conectar todas as histórias e personagens, cada um com seu demônio interior e exterior. A cada página você vai sentir uma espécie de incomodo, receio e estranheza.Uma das grandes sacadas do autor é se colocar como alguém que está conhecendo a história junto com o leitor, um recurso que poucos escritores conseguem fazer, e é esse o gancho que faz você não largar o livro até o final. 

No prefácio, Raphael Montes diz que os contos podem ser lidos fora de ordem, mas acho melhor ler na seqüência e tentar se ater ao pequenos detalhes.Talvez pela ânsia de descobrir o que está acontecendo, você não consiga fazer isso na primeira vez.

Particularmente, já li o “O Vilarejo” três vezes, e sempre descubro alguma coisa que passou batido. Leitura altamente recomendada para fãs de clássicos do terror.

   
O Homem de Giz – C.J Tudor

Em seu primeiro livro, CJ Tudor consegue chamar a sua atenção com uma história que parece bem familiar e cheia de referencias as obras de Stephen King.

O que poderia ser um tiro no pé, torna-se a grande “sacada” do “Homem de Giz” que intercala capítulos entre o passado e o presente do personagem, também narrador da trama, Eddie Adams.

No melhor estilo “Conta Comigo” e “IT”, um grupo de amigos encontra na floresta um corpo desmembrado de uma jovem; e um detalhe, a cabeça não está no local. O crime irá assombrar a vida de todos os personagens durante trinta anos. Não, isso não acontece em Derry, no Maine. A história se passa na Inglaterra e os capítulos são intercalados entre os anos de 1986 e 2016.

Logo no começo, você percebe que o personagem principal Eddie tem algum problema de comportamento e também que ele não é um cara muito confiável. Isso fica evidente principalmente nos capítulos em que ele e os amigos são adolescentes. Existem pequenas mentiras ou verdades omitidas, coisas que a principio parecem insignificantes mas que sempre refletem de maneira negativa em alguém do grupo ou fora dele.

É interessante a maneira que a escritora costura esses pequenos detalhes. Porque no fundo nós poderíamos fazer o mesmo, ou por medo de contar a verdade ou por achar que uma pequena mentira não irá causar mal nenhum. O fator causa e efeito e suas consequências fazem a trama funcionar, até menos que o suspense ou terror.  

Para aqueles que devoram livros policiais, na metade do livro você já sabe quem é o assassino, mas mesmo assim você não entende bem quais são as reais motivações para o crime.

E o giz? Qual é a história? E a cabeça, onde foi parar ? Essas duvidas você só irá descobrir no final, não vou contar porque é spoiler !!!


Caixa de Pássaros – Josh Malerman

O livro surpreende por ser diferente em sua narrativa e também claustofóbico.
A ansiedade por algo que você não entende e não consegue ver está em cada capítulo.
É o medo primal do desconhecido e do escuro, o que é real ou imaginação.

Durante quatro anos, Malorie mora em uma casa com seus filhos, sem recursos de água, luz ou comunicação.Vive praticamente no escuro, todas as janelas estão lacradas por tábuas e cortinas.Anos antes, uma onda de mortes, foi relacionada a uma luz misteriosa vista pelas vitimas antes delas cometerem crimes ou suicídio. Durante o surto, muitas pessoas se juntaram em grupos para se proteger, mas nem sempre isso era uma garantia de segurança.

Em seu primeiro livro, Josh Malerman sabe trabalhar esses elementos muito bem.A trama é ágil e com muitos diálogos e sem muitas descrições do que pode ter acontecido no passado. Esse é o gancho da história, como aquela mulher que diz que vive em uma casa com duas crianças, durante anos; sem luz, quase sem alimentos e que precisa vendar os olhos para poder pegar água em um poço foi parar lá. O que aconteceu foi real ou histeria coletiva? Será que tudo já passou ou continua silenciosamente? E como ela vai conseguir sair de lá e tentar a sorte a procura um novo abrigo que talvez nem exista.

Josh Malerman consegue te prender durante grande parte da trama exatamente pela curiosidade, não é um livro de terror, mesmo que exista o fator sobrenatural, segue mais a linha do suspense psicológico. O livro foi adaptado para filme, estrelado pela Sandra Bullock _ ótima escolha_ e tem sua estréia pela Netflix para o segundo semestre de 2018. Mas é aquela história: leia o livro depois veja o filme.




CAIXA DE PÁSSAROS 
AUTOR : JOSH MALERMAN
EDITORA : INTRINSICA
ISBN : 9788580576528

O VILAREJO
AUTOR : RAPHAEL MONTES
EDITORA : SUMA DE LETRAS
ISBN : 9788581053042

O  HOMEM DE GIZ
AUTOR : C J TUDOR
EDITORA : INTRINSICA
ISBN : 9788551002933





     



terça-feira, 29 de maio de 2018

O Conto da Aia _ The Handmaid's Tale / O livro e a série


O Conto da Aia – O Livro

Em primeiro lugar, vamos deixar bem claro:
“O Conto da Aia” não é um romance feminista.
Quem vende essa idéia ou nunca leu o livro, ou interpretou a história de forma equivocada.

A voz feminina que narra os acontecimentos mostra que tanto homens quanto mulheres podem ser extremamente cruéis. Pessoas que deturpam as palavras da Bíblia a seu favor, tirando frases do contexto ou usam apenas as partes que os favorecem.O patriarcado existe, mas ele só se mantém porque as mulheres dos Comandantes apóiam as decisões tomadas para o bem da nação.Uma nova ordem organizada por fanáticos religiosos que acreditam que a infertilidade das mulheres é um castigo de Deus, por causa do sexo sem compromisso, da homossexualidade e de todas as promiscuidades que eles jamais cometeriam.

Após um golpe de estado é criada a Republica de Gilead, onde não existe televisão, revistas, livros ou qualquer outro meio de comunicação_ pelo menos não para as mulheres _a vigilância é extrema e o medo faz com que, aqueles que não estão no poder fiquem em o silencio. Sob o olho dele

As Tias, mulheres designadas para doutrinar as Aias, usam várias passagens bíblicas para justificar a “posição sagrada” dessas mulheres que foram escolhidas para gerar novas vidas para a nação.Durante esse processo de doutrinação e lavagem cerebral, o que não falta é abuso de autoridade, humilhações, castigos e mutilações. Bem aventurados os mansos, pois eles herdarão a Terra

A situação não melhora muito quando as Aias vão para as casas dos Comandantes. Uma vez ao mês elas são estupradas por esses homens, com o consentimento e a presença de suas esposas durante o ato. Mas, segundo a passagem bíblica, Gênesis 30,  isso não tem problema algum, porque a própria esposa de Jacob, Raquel, pede para seu marido fertilizar a criada deles para que ela, Raquel, possa ter um filho... Bendito seja o fruto.

Mas no intimo as mulheres dos Comandantes não aceitam muito bem essa situação,  porque os abusos e humilhações contra as Aias continuam ou pioram. Algumas Aias enlouquecem e se matam ou sofrem falsas acusações e são condenadas a pena de morte.Tudo em nome de Deus

O Conto de Aia é um livro de reflexão sobre a política, o fanatismo religioso e sobre quem detêm o poder. Para alguns é apenas uma história de ficção distópica, para outros é quase uma profecia dos dias vindouros.Como a protagonista diz em uma passagem; tudo aconteceu aos poucos, não mudou de um dia para outro.

Na vida real, muitas “religiões” e seitas praticam coisas parecidas até hoje: poligamia, pedofilia, incesto, mutilação sexual feminina ... E os teonomistas infelizmente não são uma invenção da ficção literária. Eles estão entre nós e acreditam que as leis judiciais do Velho Testamento devem ser aplicadas na sociedade moderna. E como sabemos, nas histórias do velho testamento encontramos assassinatos, infanticídio, estupros... Olho por olho, dente por dente. Saber que pessoas subjugam outras dessa maneira, sem a menor dor na consciência e ainda acreditam estar agindo em nome de um deus é muito assustador.



“Estou me apaixonando”, dizíamos, “estou caidinha por ele" Éramos mulheres que caiam. Acreditávamos nisso, nesse movimento para baixo: tão adorável quanto voar, e ao mesmo tempo tão terrível, tão extremo, tão improvável. Deus é amor, disseram um dia, mas invertemos isso, e o amor, como o Céu, estava sempre ali, logo depois da esquina. Quanto mais difícil fosse amar aquele homem especifico ao nosso lado, mais acreditávamos no Amor, abstrato e total.Estávamos esperando, sempre, pela encarnação. A palavra tornada carne."

Art by Zoë van Dijk


O Conto da Aia – A série

Se ao ler o livro você pode se sentir desconfortável, assistir algumas cenas pode ser uma experiência até pior.

As humilhações que as Aias sofrem pelas Tias, os apedrejamentos, os seqüestros das crianças, a tomada de poder pelos militares religiosos e a bizarra cena da cerimônia de “fertilização” (vide estupro) das Aias. O livro mostra só uma das possibilidades do que o ser humano é capaz de fazer com o outro em busca do seu próprio beneficio.

As diferenças da série para o livro não são muitas. Pelo menos nessa primeira temporada os roteiristas foram fieis ao texto original. No livro não fica explicito como tudo aconteceu, as lembranças de Offred sobre sua “vida de antes” são vagos, quase como se ela não se lembrasse de seu passado. A tentativa de fuga do país, o seqüestro de sua filha, a morte de seu marido, tudo começa a se tornar cada vez mais distante e irreal.

Não existe uma explicação da tomada de poder, os primeiros conflitos...tudo isso fica por conta da imaginação do leitor. A partir dessa lacuna de informações os roteiristas conseguem criar o passado da protagonista June/Offred e também do inicio da Republica de Gilead.

Acertam ao contar o passado do casal Waterford, idealistas da rebelião teonomista e todo o desenvolvimento do governo e leis criados pelo grupo. Ao mostrar a amizade de June e Moira antes do evento, e dar mais espaço para a história de Moira.

A escolha de elenco feminino é muito bom.
Elisabeth Moss está perfeita como June/Offred, apenas com um olhar ela consegue passar os sentimentos conflitantes da personagem: medo, revolta, nojo, sarcasmo...mas ao mesmo tempo precisa engolir tudo isso e sorrir para não ser punida.

As excelentes atuações de Samira Wiley, Madeline Brewer, Alexis Bledel que interpretam as Aias. E temos também as autoritárias: Yvonne  Strahovski, que interpreta a esposa do Comandanteque, que é uma psicopata de primeira, e Tia Lydia; interpretada pela incrível Ann Dowd, fanática religiosa que doutrina as Aias na base do aguilhão de gado.

 O criador encontra sua criação> A escritora Margaret Atwood e Elisabeth Moss.
Na sequencia: 
Alexis Bledel, Samira Wiley, Ann Dowd, Madeline Brewer e Yvonne  Strahovski 
Foto> Victoria Stevens para W Magazine 

Já o elenco masculino, tenho minhas ressalvas.

Vamos ser sinceros, Joseph Fiennes perto dos 50 anos, continua muito bem fisicamente e com seu charme tipicamente inglês, difícil vê-lo como o comandante Waterford. Como sempre sua atuação é muito boa, e consegue dar um ar vilanesco ao personagem. 

O ator O.T Fagbenle, que interpreta o marido de June, precisa ter uma força maior, talvez na segunda temporada isso aconteça.Por enquanto sua participação na serie é só ok.

E a escolha que menos faz sentido é a do ator Max Minghella, que interpreta o motorista Nick, ele é totalmente inexpressivo na voz, olhar...não passa a importância que o personagem tem na trama. Sabe o famoso q.i ? Parece que foi assim que ele ganhou o papel.

A segunda temporada começa agora em Abril, vamos aguardar as mudanças e reviravoltas das histórias que ficaram em aberto e o que acontecerá aos personagens. Pois agora tudo pode tomar um rumo diferente, já que pelo menos 80% da história do livro já foi adaptada.


 Joseph Fiennes, O.T Fagbenle e Max Minghella


 ***Spoiler***
No livro os personagens masculinos são bem diferentes de várias maneiras :

*   O marido de June morre durante a fuga, simples assim.

** O comandante Waterford descrito no livro seria mais ou menos o Harrison Ford nos anos 1990. Um senhor bem apessoado, na faixa dos 60 anos, com cabelos brancos, educado e que até sente um tipo de compaixão para com June/Offred, apesar de tudo.

*** O motorista Nick é um dos personagens enigmáticos.Você só vai entender suas reais intenções ao final do livro. Ele é um dos subordinados do Comandante, um homem por volta dos seus 40 anos, alto, magro_ alguém parecido com o ator Paul Bettany por exemplo_ que dentro da nova Republica não pode ter nada; uma casa, uma família, uma mulher.Porque na “vida de antes” ele era um Zé ninguém e nessa continua do mesmo jeito. Muitas Aias o consideram um “Olho”: espiões infiltrados para vigiar/denunciar as Aias e até mesmo dos Comandantes.

O CONTO DA AIA  (1985)
AUTOR : MARGARET ATWOOD
EDITORA : ROCCO
ISBN : 9788532520661